sexta-feira, 11 de julho de 2008

Unwritten

"Tenho ouvido muita música ultimamente. Aliás, tenho feito apenas isso para sanar o meu ócio e espantar da minha cabeça pensamentos improdutivos. Músicas novas de artistas que estão despontando no cenário internacional. Mas a música que realmente me fez pensar sobre o momento em que vivo agora é Unwritten, da cantora britânica Natasha Bedingfield, que foi lançada há alguns anos atrás. Essa música marcou toda a minha mudança de vida no início de 2006.

Uma cena especial, que vem a minha mente quando começo a ouvi-la, em uma espécie de flashback, aconteceu em um típico dia de primavera. Uma grande amiga minha e eu, andando por uma das rampas da faculdade que é revestida por aquela desbotada cobertura preta de plástico cheia de bolinhas. Indo em direção ao saguão, com os óculos escuros no rosto e de mãos dadas, subíamos cantando em voz alta o refrão: “Feel the rain on your skin!/ No one else can feel it for you,/ Only you can let it in!/ No one else, no one else/ Can speak the words on your lips./ Drench yourself in words unspoken,/ Live your life with arms wide open!/ Today is where your book begins… The rest is still unwritten!”. Sorridentes, felizes por estarmos ali. Sem problemas maiores. Éramos ainda crianças.

Eu não imaginaria quais problemas enfrentaria anos seguintes. Amor, amizade, desconfiança, raiva, desilusão. Era apenas o começo e o livro ainda não estava nem no primeiro capítulo.
Semanas, meses, semestres, anos se passaram.

Depois de algumas semanas sem escrever, desde minha última crônica Chorar, me vi em uma posição reflexiva novamente. Desta vez sobre essa música e eu agora. Em português, o título é Não Escrito. Mas o que na minha vida ainda não está escrito?

Durante todo esse tempo de descobertas, de novas páginas no meu livro, posso dizer que realmente a fase mais intensa foi essa em que vivo agora. Ou que vivia. Aquela que iniciava seu ciclo há exatamente um ano atrás. Uma fase onde pude viver, sentir, sonhar e realizar intensamente todos os planos que eu, um dia, imaginava para mim.

Mas ainda há muito que acontecer. Durante esse tempo sem escrever, pensei enquanto caminhava solitário nas férias, muitas vezes não tão só, que eu estava errado mesmo. E teria que admitir. Já admiti que estava errado, mas continuei errando. Tudo bem, é humano. Mas para mim não dava mais. Prometi não chorar, mas chorei. Prometi tantas coisas que nem metade eu cumpri.

Quero começar essa página em branco logo. Quero virá-la e começar a escrever coisas que me façam feliz de verdade. Sofrer também é sinônimo de amor, de paixão, de gozo. Quem não sofre por aquela pessoa que te faz dar um sorriso todas as manhãs ao abrir a janela e dizendo “bom dia”? Por aquela pessoa que faz uma surpresa em um dia vazio, completando-o? Por alguém que te liga e conta sobre os seus problemas, e você ouve, ajuda, orienta e consola, fazendo com que você se sinta realmente importante? Por aquela pessoa que ao cruzar com você na rua depois de tanto tempo te abraça tão forte que você pode sentir o calor dela invadindo seu peito?

Quem nunca sofreu por alguém que gosta? Sofrimento é como aquela poeira que permanece em um travesseiro de coração. Não se manifesta e é imperceptível. Mas quando o coração se mexe de forma brusca, todas aquelas partículas tomam conta do lugar, nos cegam e deixam tudo mais embaçado. Os olhos enchem de lágrimas, há um aperto no abdômen, uma respiração profunda. Espirro. Silêncio. Alívio em se sentir mais leve.

Estou deixando o sol luminar as palavras que eu não encontro. Deixar com que a própria vida encontre seus meios. Para que no rosto das crianças eu possa sentir o prazer de sorrir novamente e sonhar. Sonhar e colocar em prática tudo que sonho. O sonho impossível é aquele que ainda não pude sonhar.

Vou deixar a chuva molhar minha pele naquele dia de calor, sem me amedrontar com os raios e o vento. O vento leva para longe o que precisamos. Mas o que é nosso de direito sempre volta como em um furacão.

Não quero escrever uma nova história totalmente feliz. Felicidade é perfeição. E a perfeição é sem sal. Quero sentir. E sentir engloba tudo. Alegria, tristeza, tesão, saudade, agonia... Muito menos não vou escrever cartas de libertação. Porque nunca fui escravo e nunca me escravizarei. Libertar-se é trair sua identidade. Se procuramos alguém para nos libertar, é por que vivemos presos na nossa própria vida. Nos libertamos e nos prendemos novamente a uma outra vida.
Vou buscar a coisa mais distante de mim. Mas está tão longe que pode estar perto e provar não é diminuir a distância. É apenas saber saborear o que eu posso oferecer e o que as pessoas podem me oferecer.

Não ofereço muito, já que sou pouco. Mas pouco não significa disperso. Pode significar concentrado. Sou uma essência em que o pouco se faz muito, e o muito é obsoleto em dizer-se que seria pouco.

Minhas antigas tentativas estão na página anterior, estão presentes na forma com que e do que escrevo. Tentativas frustrantes de buscar uma perfeição que não existe nem em mim e nem em ninguém. Por mais que alguém tente escrever algum livro perfeito, para muitos pode parecer um simples livro de capa-dura e sem edição.

Vou escrever tudo o que quiser, e, em conseqüência, dizer tudo que eu pensar e sentir. O personagem que está incompleto ainda sou eu.

Sei disso porque compreendo que apenas eu posso deixar com que as coisas entrem e saiam da minha vida. Do meu livro. Apenas eu posso segurar e soltar as oportunidades que me são dadas e fazer delas as melhores escolhas. Compreendo que agora se eu não entender o que eu sinto, ninguém entenderá. Ninguém sentirá por mim.
Então deixe-me que sinta e que pegue a caneta na mão para rabiscar alguns contornos na página, anotar alguns personagens principais. Saber de todo o enredo, de toda a trama e para onde ela me levará com o que colocarei em prática, eu não consigo imaginar.

Apenas sei que todo o resto do meu livro, que começa hoje, ainda não está escrito!"

(Texto produzido dia 11/07/2008)
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