domingo, 14 de junho de 2009

Mais do mesmo

"Talvez seria a primeira vez que ele a via. Pouco a pouco, com o comboio a chegar, o coraçao dele batia cada vez mais acelerado. Com o amigo do lado, comentava sobre qualquer assunto banal para esconder as maos suadas e o nervosismo que afloravam a sua pele.

A mesma pele que depois de algumas horas de conversa com ela se sentiria mais a vontade ao ser tocada. Os risos começavam a ser incontrolaveis. A sensaçao de ja a conhecer de algum lugar o fazia relaxar, pouco a pouco. As maos suadas se apertavam, lentamente, uma contra a outra, para procurar o que dizer, para segurar as pequenas besteiras que dizia. Na realidade, ele começava a entender que quanto mais ela se divertia com ele, mais ele ficava a espera de algum toque, de algum contato fisico para que pudesse colocar a cabeça para baixo e depois levantar o olhar lentamente e ve-la se recompor do riso largo e bonito.

O mesmo riso que ao longo do tempo o faria estremecer, deixar para tras tudo que ja havia passado. O passado aos pobres e errantes pertencia. Naquele momento, eram ricos e estavam fixos ali. Um de frente para o outro sem saber o que fariam, que coisa comeriam. Os sorrisos nos olhos demonstravam o que ali acontecia. Nao era preciso mais nenhum gesto, nenhuma palavra, nenhuma forma de expressao velha ou inusitada. Era preciso apenas aquele olhar, aquela forma de se expressar, aquele olho no olho que apenas o quarto, com a lampada de iluminaçao amarela, moveis, cadeiras e estantes de cores afins, poderia entender. Nada deveria ser entendido a partir daquele instante. Os arrepios, o calor, o frio na barriga, o coraçao disparado seriam reflexos de apenas olhares que procuravam um porto seguro e de poucos toques na pele branca, macia, com um cheiro levemente adocicado como o sabor das pequenas frutas do bosque encontradas na primavera nos tropicos.

O mesmo sabor que quando ela pediu para que ele fizesse companhia na noite, ele recusou. As frutas do bosque possuem um aroma doce, um gosto leve e um leve toque acido. Como se as frutas soubessem que por serem tao desejadas, nao poderiam ser ingeridas por serem acidas. Nao amargas. Com a mesma rapidez que o acido da polpa entra em contato com a lingua viva, ele negava o convite. A cada "nao" pronunciado, seu coraçao denunciava uma taquicardia, leve e fulminante. Ela se despediu, disse que iria dormir. Ele apenas começou a arrumar suas coisas, pensando novamente em que parte do "sim" seria mais dificil de dizer.

O mesmo "sim" que as pessoas utilizam com tanta falta de vontade e assumindo culpas que nao sao delas. Pelo menos, nao mais. Ela se deitou e o chamou para se aproximar com seu livro de desorientaçao. Ela se deitou e ele apenas se sentou perto dela, na cabeceira da cama. Querendo ler o que ele escrevia, ela colocou seu rosto sobre as pernas dele. Para ele foi inevitavel a abraçar e fazer de seu braço um travesseiro um tanto quanto incomodo. Mas ela parecia bem naquele braço, os risos ainda continuavam, escondendo a forte vontade que ele sentia de abraça-la e te-la definitivamente em seus dois braços. Um seria pouco para o que ele sentia. As palavras soltas, o coraçao que saltava, os arrepios que lhe gelavam e aqueciam.

Os mesmo arrepios que ele sentiu quando se deitou ao seu lado na cama depois de muito renegar seus desejos. Os braços dela pareciam perfeitos naquele instante. Era o que ele queria sentir. Mas eram poucos momentos em que ambos sentiam o calor dos corpos. Ela se virou na cama, ele a encarou. Os olhos falavam palavras que nao existiam. Eles se aproximavam pouco a pouco, a respiraçao se tornava leve e pausada. Ela salivava, ele lambia seus proprios labios pequenos. Um sorriso envergonhado interrompeu a aproximaçao.

O mesmo sorriso que as pessoas continuam a esconder no dia a dia. Escondem por se sentirem mais vulneraveis a erros. Erros todos cometem, mas nunca se deve temer viver, sonhar por causa de um sorriso que ja nao se parece tao doce como era. Os milagres acontecem em pequenos gestos, em pequenas esperanças, em pequenas surpresas que nòs deixamos entrar na nossa vida. Os milagres sao como sorrisos singelos. Apenas acontecem se estamos abertos para que aconteçam. Ele segurou a mao dela, a olhou novamente nos olhos, as testas se encostaram, as respiraçoes se tornaram uma so. Os olhos serviriam apenas para que a escuridao trouxesse claridade. Que aos poucos, o instinto e vontade procurassem o encontro dos labios.

Os mesmos labios que se perguntavam para o espelho se ele estaria bonito hoje. Cada um sabe o que vale. Se alguem ainda nao encontrou a pessoa certa, de alguma forma para superar o peso, os labios serviam para questionar, conversar. O beijo seria apenas uma forma de selar um acordo entre ambas as partes. Estariam dizendo que para mim, voce me agrada. O comboio ja estava a partir. O coraçao dele estava mais leve, mais calmo. Apenas batia mais forte por saber que toda aquela espera, ainda deveria esperar. A pele, o riso, o sabor, o "sim", os arrepios, o sorriso, os labios. Todos poderiam ser os mesmos, mas naquela hora ele sò desejava mais um. A saudade apenas que ficava. E essa era a mesma de dias."

(Texto produzido dia 13/06/2009)

5 comentários:

aline gianazzi disse...

antes de tudo, feliz aniversário.

talvez eu saiba demais, talvez seja carência, mas eu meio que vivi esse seu texto enquanto lia.
adorei.

Anônimo disse...

Concordo com a Aline e acrescento q no final, percebi q estava cheia de sorrisos =)

Bjos Babi

Anônimo disse...

perfeito!
eu me calo diante disso.

Fer

reinaldomas disse...

Pois é... é dificil ler o texto e nao se identificar (mesmo que com parte dele). Li ouvindo Smash Into You, confesso! uahauauha

ABração fio! Sucesso sempre

Letícia Fiochi disse...

Acho que todo mundo que ler esse texto vai se identificar por ter vivido, ou por estar vivendo algo parecido...é o tipo de leitura que você prende a respiração e segue ansiosamente até o final...que não finaliza..rs..o melhor texto desse espaço!!Eu amei!